Para os que vilanizam Kathleen Kennedy, o porão é mais embaixo
Desde o levante reacionário que notamos crescer no mundo atual com a subida de amantes do autoritarismo de governos como Trump e Bolsonaro, os seus fãs se tornaram fundamentalistas promovendo uma verdadeira cruzada contra as culturas que chamam de lacração, woke e invasão comunista e outros delírios que tornam qualquer debate inviável, a troca de pontos de vista quase impossível e assim a gente perca a paciência acreditando estar perdendo o tempo em debater questões como essa com quem não analisa o mundo de forma mais plural e aberta.
A dica que a gente dá para os leitores que ainda gostam de pesquisar o mercado multimidiático cultural, é sempre pesquisar e não perder tempo com alarmistas e conspiracionistas que acham que uma mulher de negócios é a grande culpada das mudanças de rumo de um produto do mercado de entretenimento. Vamos entender melhor o caminho delicado para compreender quantos nomes e departamentos estão envolvidas num provável acontecimento midiático impactante para o mundo dos negócios e assim abandonar frases rasas como “George Lucas deveria comprar Star Wars de volta” que por mais que nos agrade, o comprador de uma das galinhas dos ovos de ouro jamais cometeria tal atitude.
Melhor forma de entender isso é com o que os jornalistas Kin Masters e Alex Weprin quase nos desenham em seu texto na Hollywood Reporter acerca de um boato que rondou os principais veículos da imprensa de entretenimento.
Algumas semanas antes de Bob Iger se sentar para aquela entrevista à CNBC na qual ele disse que as redes de TV lineares da Disney , como ABC e FX, “podem não ser essenciais” para os negócios da empresa, um veterano executivo de Hollywood refletiu com o The Hollywood Reporter no possibilidade de um acordo que abalaria a indústria: a Apple comprando a Disney. É uma ideia que continua sendo discutida, embora muitos altos executivos tenham zombado dela. A Apple não quer comprar um estúdio, dizem eles, e de jeito nenhum os federais permitiriam que um grande negócio como esse acontecesse, embora os próprios jornalistas ainda não descartem a possibilidade. “Não acho que [a Apple] compraria a empresa como ela existe atualmente”, disse ele. – “Mas se você vir Bob começar a se desfazer de coisas… parece que ele está se preparando para uma venda. E claramente não há comprador como a Apple.” Não muito depois disso, Iger apareceu na televisão e pendurou uma placa de possivelmente à venda nos negócios de TV da Disney. E assim foi possível vislumbrar um pouco mais os contornos de uma Disney enxuta que poderia ser um tentador alvo de aquisição. Claramente não há comprador como a Apple, que tem US$ 62 bilhões em caixa e equivalentes a caixa e um valor de mercado de US$ 2,8 trilhões. E embora possa ser bem verdade que a Apple não queira comprar um estúdio, talvez queira comprar “este” estúdio – aquele que, apesar dos desafios do momento, tem um cofre cheio de IP’s inestimáveis e continua sendo a mais valiosa, uma marca de entretenimento. (Nota do Editor: aqui a gente nota como a experiência de consumidor fala mais alto, por mais que quando noticiamos, por exemplo que Lando ganhou Donald Glover como novo roteiristas no lugar de Justin Simien. Alguns desavisados já aparecerem nas publicações com frases como “Não foi o que eu pedi” ou “melhor que nem façam”. A Disney comprou as marcas pra justamente fazer produtos com ela.)
UM CASO ANTIGO
E há um “relacionamento especial” de longa data entre a Disney e a Apple: Steve Jobs atuou no conselho de diretores da Disney de 2006 até sua morte em 2011. Iger ingressou no conselho da Apple logo após a morte de Jobs. Ele renunciou ao cargo em 10 de setembro de 2019, mesmo dia em que a Apple anunciou oficialmente que estava entrando no negócio de conteúdo por meio de seu serviço Apple TV +. Alguns executivos de Hollywood têm antecipado um futuro em que o rebanho do estúdio continuará diminuindo – dramaticamente. “Haverá três ou quatro plataformas e todas as outras serão esvaziadas e adquiridas”, diz um veterano do setor. “Haverá Apple, Amazon, Netflix e um outro. Se você pudesse juntar NBC Universal, Warners e Paramount, provavelmente teria o suficiente para sobreviver.” (Os federais podem ter algo a dizer sobre qualquer versão dessa combinação potencial nos valores finais da receita.)
Se Iger vê o mundo da mesma maneira, encontrar um lar para a Disney pode ser uma tentação. Várias fontes dizem que Iger, tendo retornado ao cargo de CEO em novembro, nunca enfrentou tanto estresse. Ele não apenas está enfrentando uma indústria em transição, mas grande parte da equipe que esteve com ele nos bons anos não está mais na empresa: o conselheiro geral Alan Braverman e o chefe do estúdio de cinema Alan Horn se aposentaram. A CFO Christine McCarthy, tendo se aproximado um pouco demais de Bob Chapek durante sua gestão como CEO, se foi após 23 anos na empresa. Isso pode explicar a reaproximação de Iger com os ex-executivos da Disney, Kevin Mayer e Tom Staggs, ambos preteridos como CEO, mas que recentemente foram nomeados consultores da empresa. (Os dois são sócios em seus próprios negócios, Candle Media.) Eles conhecem bem a empresa e não apenas podem ajudar a descobrir como reduzir os custos do Disney +, mas também podem ajudar em uma possível venda dos ativos de TV linear, incluindo a rede de transmissão ABC e suas oito estações de TV locais, bem como canais a cabo como Freeform e National Geographic.
COMO FICAM OS OUTROS BRAÇOS DA DISNEY?
Outras participações, como Disney Channel e Disney Junior, pareceriam ter valor mínimo sem o conteúdo e o apoio da empresa maior – e a FX sem a mão de programação de John Landgraf e sua equipe também pareceria desvalorizada. Um observador experiente prevê que a Disney “carregará esses ativos com dívidas e venderá para private equity”. Ele acredita que as propriedades, que devem gerar US$ 7 bilhões por ano em lucros, seriam vendidas por US$ 50 bilhões. (As redes lineares da Disney geraram US $ 8,5 bilhões em lucros no ano fiscal de 2022, embora deva diminuir à medida que o corte de cabos continuar.)
A Disney poderia colocar US$ 25 bilhões em dívidas da Disney no negócio, reduzindo sua carga de dívidas para US$ 20 bilhões. A empresa já está avaliando a venda dos negócios na Índia que adquiriu da Fox. E não seria surpreendente ver uma venda de sua participação majoritária na Nat Geo (talvez em conjunto com a venda do canal a cabo). A participação de 50% da Disney na A+E Networks provavelmente também estaria disponível para o comprador certo (Hearst possui a outra metade). A ideia de que a Disney possa vender está no topo da cabeça de alguns analistas de Wall Street. A analista da Needham & Co. Laura Martin afirmou por algum tempo que a Disney poderia vender para a Apple. Ela prevê que a Disney “será comprada durante os próximos três anos”, observando que os prêmios de aquisição para empresas de mídia geralmente estão na faixa de 30 a 40%. “Se eles não venderem, a Disney estará competindo com essas empresas [de tecnologia] em um setor com economia em deterioração (porque eles nunca precisam ganhar dinheiro com conteúdo), acreditamos”, escreveu Martin em 14 de julho.
OS SINTOMAS DA PROXIMIDADE DA APPLE
Em uma nota de pesquisa em junho, Martin disse que a Disney poderia dar à Apple o catalisador necessário para impulsionar a adoção de seu futuro fone de ouvido de realidade aumentada Vision Pro. “O fato de o CEO da Disney, Bob Iger, estar no palco divulgando os óculos Vision Pro da Apple demonstra o ajuste estratégico atraente entre o conteúdo da Disney e a tecnologia vestível da Apple”, escreveu ela. Nem todo mundo é tão otimista em um negócio. Anthony Sabino, advogado e professor da St. John’s University (e autodenominado “fã louco da Disney”), diz que a extensão do contrato de Iger e a potencial venda dos ativos de TV linear da Disney “demonstra que eles [o conselho da Disney] querem que ele oriente a empresa, e não há nenhum pensamento de ele vender a empresa.”
Qualquer acordo que a Disney faça certamente atrairá um exame minucioso do governo Biden, que tem sido agressivo ao processar para impedir que acordos significativos sejam concluídos, embora com resultados mistos. “É certo, é uma certeza absoluta que se houvesse alguma conversa sobre a fusão da Disney com outra pessoa, isso seria escrutinado até o enésimo grau pela FTC, pelo Departamento de Justiça”, diz Sabino. “Então, isso seria basicamente cair em uma armadilha para ursos na qual não tenho certeza se alguma empresa estaria disposta a mergulhar.” Um governo republicano pode se mostrar mais tolerante quando se trata de um grande negócio (embora tenha sido o governo Trump que tentou e não conseguiu impedir a aquisição da Time Warner pela AT&T). As áreas reais de sobreposição entre a Apple e a Disney não são tão significativas – nem de longe a sobreposição de, digamos, a aquisição da Fox pela Disney, que derrubou um estúdio legado. A questão seria o tamanho e o poder das empresas combinadas. Mas dois processos recentes, um da FTC e outro do DOJ, podem ser relevantes para qualquer acordo com a Disney.
O MUNDO DE GAMES ESTÁ JUNTO
Mais recentemente, a FTC vacilou em seus esforços para bloquear a aquisição da editora de videogames Activision Blizzard pela Microsoft. É uma situação semelhante, com um gigante da tecnologia e proprietário de plataforma buscando adquirir o que é, antes de mais nada, uma empresa de conteúdo que é o que vemos nessas plataformas de streaming. A Microsoft prometeu preventivamente continuar disponibilizando jogos importantes para concorrentes como Nintendo e Sony, uma decisão que foi persuasiva para o juiz do caso, fornecendo um possível roteiro para um acordo da Disney com um gigante da tecnologia. Por outro lado, o Departamento de Justiça obteve uma grande vitória quando um juiz bloqueou a venda da Simon & Schuster pela Paramount para a Penguin Random House em 2022. O DOJ apresentou um argumento de “monopsônio” (Em economia, monopsônio ou monopsónio é uma forma de mercado com apenas um comprador, chamado de monopsonista. É um tipo de competição imperfeita, inverso ao caso do monopólio, onde existe apenas um vendedor e vários compradores), ou seja, que a fusão seria prejudicial aos autores que desejam vender trabalho deles (alguma proximidade com o que já vimos na greve, talvez?). Com todos os compradores lógicos da Disney já possuindo seus próprios estúdios, o governo poderia fazer um caso semelhante, embora uma fonte especule que a Disney poderia se oferecer para alienar preventivamente alguns ativos do estúdio (como 20th Century Studios e Searchlight Pictures) para manter o nível de competição em o mercado estável e evitar um caso de monopsônio.
UMA EMPRESA DE ACIONISTAS QUE SÃO FÃS
Os fãs leais da Disney, muitos dos quais são acionistas, desconfiariam do compromisso de uma empresa de tecnologia com os principais negócios de entretenimento e parques temáticos da Disney. É um grupo que inclui o Sabino. “O alvoroço dos acionistas da Disney seria insano”, diz ele. Mas com mais de 1,8 bilhão de ações em circulação, e com mais de 60 por cento dessas ações detidas por investidores institucionais, os fãs de acionistas de varejo da Disney podem não ter o que é preciso para bloquear um acordo. Há uma pessoa que pensa em um acordo entre a Apple e a Disney há anos. Em suas memórias de 2019, The Ride of a Lifetime , Iger escreveu extensivamente sobre sua amizade com Jobs, que fundou a Pixar e a vendeu para a Disney em 2006. Antes da pandemia, antes de voltar da aposentadoria para administrar uma Disney que enfrentava enormes desafios. , Iger escreveu: “Acredito que, se Steve ainda estivesse vivo, teríamos combinado nossas empresas ou pelo menos discutido a possibilidade com muita seriedade.”
CONCLUSÕES ESPECULATIVAS
Se antigamente este era um modelo de negócios que dava muito dinheiro para todo mundo que estivesse envolvido, hoje esse formato está quebrado tanto quanto a idéia da TV Linear com “gradezinhas” que te prendem aos horários deles só tem valor afetivo a população das gerações que resistem ao streaming. Este modelo de negócios foi quebrado por três frentes: o modelo que conhecemos da Netflix, que desvalorizou TV até destruir o modelo de negócios de TV a cabo. E se vocês lembrarem bem, todo mundo foi atrás. Basta lembrar que o preço dos serviços da Netflix começou em 8 dólares e hoje está acima de 20 dólares.
A segunda frente que chega, tem empresas como Google e Facebook que estão constantemente mudando o mercado da propaganda. Vale muito mais investir numa propaganda direta do que alugar um horário nobre na TV em seus horários mais caros. O que diminui consideravelmente o quanto as TV’s abertas lucram.
A terceira frente é justamente o gargalo da situação onde o mais atento compreende os processos e não gasta verbo e inteligência pintando uma produtora executiva como Kathleen Kennedy (que está abaixo de Iger) de vilã que destrói seus passeios na nostalgia do quanto era bom ser criança e consumir Star Wars e notar que a fragilidade de Star Wars, Marvel e outras “franquias” que se tornam uma metralhadora de conteúdo que raramente tenha qualidade, e feitos com métricas bem específicas baseada em números sem sentido (como horas assistidas de uma série ou quando trocam de série, etc. e valorizando uma estrutura básica e não criatividade) e isso tira um pouco da individualidade dos produtos, do valor de sua autoria causando uma diminuição do potencial criativo que dificultaria obras livres como Breaking Bad, Sopranos e até Madmen tenham um substituto a altura. Tudo isso porque o foco está na quantidade de pessoas vendo, principalmente vendo ao mesmo tempo fazendo com que o mercado audiovisual em Hollywood parecesse ter caído no maior “esquema de pirâmide” de todos os tempos.
Justamente por isso que a greve que juntou membros da WGA (Writers Guild of America) e a SAG (Screen Actors Guild) tem o potencial de causar uma verdadeira revolução na velocidade que as mudanças chegam impactando as posições hierárquicas e freando assim uma mentalidade baseada apenas em números que o topo da pirâmide pensa, sem atrelar a necessidade que quantidade jamais significaria qualidade. Ou seja, quando muitos desavisados acreditam que uma produtora executiva que existe pra racionar os recursos financeiros seja uma monarca comandando tudo de um um trono e que não existe toda uma rede hierárquica na qual até mesmo Dave Filoni hoje faça parte como produtor executivo que lida com toda classe criativa, colocá-la como única culpada seja um dos erros primários que beira o patético principalmente quando se ouve muito o que conteudistas alarmistas reclamam sem ao menos entender um pouco mais da gestão e das cadeias de cargos existentes na Lucasfilm e como o time reflete nas obras.
Embora existam canais que propaguem informações erradas e de cunho de desafeto pessoal como Mike Zeroh, DoomCock e outros que conseguiram uma legião de fanáticos que estão ouvindo o que querem da boca destes influenciadores, o acesso está ao alcance de todos. Mas seguimos na jornada noticiando não só Star Wars, mas o que rodeia o mundo da saga e desviando de delírios coletivos que pensam que uma produtora executiva vive numa monarquia financeira homogenizando empresas como Lucasfilm, Industrial Light and Magic, Skywalker Sound e Disney ou quaisquer outras empresas e departamentos que muitos por ignorância não entendem e por consequência, tiram conclusões apressadas de um vácuo mental sem as devidas pesquisas.
Texto complementado com Paulo de Paiva durante o clipping da era da greve WGA e SAG.