A Formação da Tempestade
O quarto episódio da série O Livro de Boba Fett nos traz avanços históricos para a trama principal e ainda usa seu último recurso de flashback de forma brilhante e conclusiva.
Dirigido por Kevin Tancharoen, desde que os nomes foram divulgados dos diretores escolhidos, muito se especulava de que este episódio pudesse ser debruçado na personagem Fennec Shand, que desde o início estava sem muitos afazeres. Nosso palpite estava certo e, com um roteiro eficiente, o episódio coloca Fennec em evidência sem que isso ofusque o protagonista.
Em seu primeiro ato, a história mostra para nós, espectadores e para Fennec Shand, que Boba teve sua segunda chance, portanto ele também acredita que ela deva ter, gerando a gratidão de vida que é diluída logo nos primeiros momentos assim que Boba a salva num incrível link com o gap deixado no quinto episódio da primeira temporada de The Mandalorian (The Gunslinger). Boba a leva na mesma gangue dos MODS que conhecemos no episódio anterior, porém numa espécie de estúdio de tatuagem de Mos Eisley. Aqui, a opção dos criadores em criar uma nova gangue que tem como referencial os MODS da Inglaterra na década de 1970 faz o contraponto dos motoqueiros Niktos que são influenciados por Moto Clubes e Rockers, a gangue rival dos MODS. E manter uma outra turma dessa jovem tribo urbana, faz o link direto do que vimos que trouxe Fennec Shand de volta à vida. Essa sequência é protagonizada pelo rapper Thundercat, um tatuador que usa mão de super battledroid e foi pago por Boba a “consertar” a mestre assassina.
O que temos em diante são conversas frente a fogueira que pontuam muito bem uma assassina que quase morre e acorda com a missão de assimilar que Boba Fett voltou e ganhou um “curso de formação humanitária” com o povo da areia.
O nervo exposto que Boba toca e com certeza Fennec a ouve é porque ambos foram esquecidos nas areias, nas dunas, perto de uma morte iminente.
A Fortaleza Escondida
Nas práticas milenares dos contadores de histórias, a necessidade de uma fogueira e pessoas sentadas ao redor já foi um ponto importante em The Mandalorian, ponto este que por problemas que surgem e soluções que se resolvem, o pequeno Grogu salva Greef Karga e, com esse pequeno ato, traz seu espírito de líder da guilda para o lado do Mando.
Neste quarto episódio intitulado A Formação da Tempestade, são momentos diferentes que Fennec é confrontada pelas suas próprias crenças refletidas no conhecimento da causa que Boba carrega e testemunha para ela. Conversas que rodeiam a fortaleza de Bib Fortuna, o substituto de Jabba como senhor do crime em Tatooine. O que Boba pede para Fennec é que ela o acompanhe para a retomada de sua nave Slave 1 da categoria Firespray. E nessa empreitada, fomos acompanhar até mesmo o drone de Fennec pra entender as dependências do castelo. Durante a invasão, fomos presenteados com androides que homenageiam posições de velhos vilões e até mesmo um Lep Droid, que só havíamos visto em The Clone Wars para momentos irreverentes.
A invasão e incursão da nave foi tão bem sucedida que a sequência que poderia ser uma simples fuga com a nave se torna um drama temporal entre a quantidade de soldados que chegam, um Boba se readequando ao controle da nave e a assassina fazendo aquilo que sabe de melhor: se livrar de suas vítimas com um timing preciso.
Duelo sob o Sol
Se Tatooine nos remete ao velho oeste e a série de Boba imerge na premissa de todo filme de faroeste: é chegada a hora de uma vingança dupla: a covardia do extermínio da tribo Tusken pelas mãos dos Kintal Strider, que recebem o troco das canhoneiras da nave, que atinge todos os membros da quadrilha sem qualquer piedade e, logo em seguida, o inesperado: o protagonista afetado pelo torpor de sua fuga pela vida da cova de Carkoon, volta para Sarlacc para buscar sua armadura. Mais momentos de tensão nos leva em cheio com os tentáculos puxando a nave para baixo e sendo salvos por um ato individual de Fennec que solta uma bomba sísmica que tanto nos agrada pelo seu som característico. Sem sucesso na busca no estômago da besta, é mais uma conversa na fogueira, dessa vez com a belíssima nave ao fundo e questionamentos sobre como os empregados da grande máfia podem virar o jogo. Momentos como esse me fazem questionar o quanto o fã de Star Wars pode estar sendo convidado em The Mandalorian e O Livro de Boba Fett a prestar atenção nos diálogos e desapegar um pouco de “tiro, porrada e bomba”.
John Favreau escreveu todos episódios da série, com exceção do sexto, que o fez em parceria com Dave Filoni, e em todos seus filmes que poderiam transparecer vazios, há sempre uma atenção especial aos diálogos. Mais ainda aqui que o personagem sofreu uma espécie de reboot e endossa o tempo inteiro a sua motivação de mudança ao querer governar Tatooine.
E dessa forma se encerram as memórias de Boba Fett no tanque de bacta. Momento único para analisarmos a grandiosidade da pontuação dos fatos. Das últimas vezes que Boba esteve no tanque, foi interrompido seja por Fennec ou Black Krrsantan. Mas o ato dele acordar, desligar e se levantar, pontuam o domínio de seus atos, o domínio de seu tempo e o fim das memórias que consolidam um Boba marcado pela vida e seus arrependimentos. Chega a ser transparente o aviso do droid que confirma o fim de seu tratamento.
NENHUM SERÁ DEIXADO PARA TRÁS
O cantinho do paraíso de Garça Fwip é um dos locais mais clean de Tatooine, chega a beirar os ricos despreocupados reciclando sua riqueza. Porém, os trandoshanos que tripudiam o lugar são observados pelo já citado Krrsantan, que parece subir o sangue ao ver o povo que escraviza e usa pelo de wookie como presente. Interferir no momento da riqueza, não cair na lábia de Garça que tenta usar sua persuasão em vão, nos mostra um wookie realizando suas especialidades, os desmembramentos. Após causar no bar, finalmente nosso chefe da máfia recruta o gigantesco wookie para seu time. E assim, temos um castelo se enchendo com a escória desacreditada das ruas. Se o protagonista quer governar pelo respeito, seu caminho de escolher os comparsas apresenta um sucesso nas escolhas.
A reunião dos chefes da máfia
É noite no castelo e a porta voz de Fennec Shand age como Tom Hagen agia para Don Vito Corleone. “Consigliere” como já se prontificou em se posicionar, Shand explica aos chefes da máfia os reais objetivos de Fett que apenas ouve sentado com todo time que montou ao redor. A audácia do novo chefe da máfia ganha tons diferentes quando notamos que a mesa de reunião está sobre a jaula de rancor que resolve ser notado. Com a atenção dos membros, Fett faz a oferta irrecusável: apenas a neutralidade dos chefes da máfia para que seus negócios continuem. Oferta aceita e num belíssimo plano na torre do castelo que observa o regresso dos chefes, Fennec e Boba reconhecem a necessidade de angariar mais ajuda para a guerra que se aproxima. Como num passe de mágica e percepção, a trilha de Ludwig Göransson já nos mostra quais serão os próximos dados jogados na partida.
O capítulo encerra com muito mais certeza de que o protagonista quer e assim fez um especial de Fennec sem ofuscar o protagonista.
A guerra está por vir.