Incursão ao segundo episódio do documentário de The Mandalorian
Desde que a Disney + começou sua programação, as sextas-feiras têm sido um dia especial para o fã de Star Wars. Em novembro, começou a série Mandalorian, que exibiu seus capítulos na sexta-feira, ato que tornava o final de semana alegre aos fãs da saga. Em fevereiro, a alegria das sextas se tornou acompanhar a última temporada de The Clone Wars e agora voltamos a poder nos animar com este presente que a Disney nos deu num período de confinamento: DISNEY GALLERY STAR WARS: THE MANDALORIAN.
Essa série de documentários dos bastidores da micro série observa os arredores da produção e já temos inclusive os temas de cada episódio:
- As direções: uma visão pessoal de cada diretor, seus universos inseridos em suas obras, as bagagens e o carinho que estes profissionais têm pela saga e como convergir para um capítulo pessoal e impressionante aos espectadores.
- O legado: Qual seria a herança que a mitologia influenciou não apenas a série, mas cada um dos nomes envolvidos na produção, desde os diretores, mas também produtores.
Os que virão a seguir serão:
- O casting: o que provavelmente vai mostrar como Favreau e Filoni optaram pelas escolhas do elenco presente.
- Tecnologia: quem acompanha a página pode encontrar aqui (você também pode saber mais acessando este link), uma matéria na qual já havíamos falado das tecnologias inovadoras experimentadas na série, o que permitiu saborear ainda mais os avanços dos efeitos especiais.
- Práticos: sabemos que Star Wars embora seja um dos filmes símbolo dos avanços dos efeitos visuais em computação gráfica, ainda conta com o suporte de efeitos práticos, como por exemplo, manter o baby Yoda (The Child), que é um animatronic (um boneco) em meio a tantos efeitos de chroma Key e captura de movimentos.
Em poucas imagens reveladas antes de assistirmos a série, uma atmosfera que imperava no set de filmagem era o espírito amistoso dos atores que nunca param de elogiar como foi conhecer a tecnologia, conhecer Favreau e Filoni e a liberdade que tinham ao rodarem cada episódio. São profissionais de cinema que cresceram assitindo aos filmes e agora estão inseridos no grande projeto que sempre foi o sonho de George Lucas, um show para TV.
Neste segundo episódio, que tratava do legado, há duas mesas de debate: a mesma mesa do primeiro episódio com a equipe de direção e uma segunda mesa com os produtores, efeitistas e executivos que participaram das outras trilogias. Tivemos a grande surpresa de ouvir as palavras de John Knoll, um dos principais nomes responsáveis por dar ao George Lucas o suporte necessário de realizar os filmes. Em especial a retomada da saga nas prequels a partir de 1999 e também por ser um grande nome por trás de Rogue One, o filme queridinho dos fãs da era Disney em sair do papel.
De arquiteto e engenheiro, Knoll entrou pra ILM (Industrial Light and Magic) e começou ali sua carreira na empresa de entretenimento a ponto de manter a chama de Star Wars viva em todos que um dia tinha trabalhado em algum filme. Nós, que somos fãs quando passa muito tempo sem Star Wars no cinema, pensávamos: “Quando é que vai ter Star Wars de novo no cinema pra juntar aquela galera?” E não é que os responsáveis por fazer os filmes também pensavam assim do lado de lá?: “Quando é que vamos nos reunir pra fazer um Star Wars novo?” Era a força pulsante desses profissionais. Seja no set de um filme revolucionário como Jurassic Park ou marcante como Indiana Jones, o que mais se especulava entre os artesãos cinematográficos era: quando vamos fazer mais um Star Wars.
É por isso que a frustração de quem estuda cinema e gosta de Star Wars foi dilacerante quando líamos que os fãs de Star Wars resolveram boicotar Solo: Uma História Star Wars. Não importa se o filme seria um fiasco. Nosso alimento era ver algum cuidado estético representado por pessoas que dormiram e sonharam com a chance de ter em seu curriculum trabalhar numa fábrica de magias. Não precisa ir longe. Pra cada reclamação de que uma sequência patética da revelação da origem do nome do Solo era irritante, tínhamos pelo menos uns cinco momentos com a cara do velho Star Wars revolucionário que imitava filmes de samurai e cowboy. Seja neste mesmo exemplo o assalto do trem, o trecho da realidade da infantaria em meio à guerra, seja como era ver a malandragem de Calrissian em meio a uma cantina ou como aqueles painéis neon de Kessel nos remetia à tecnologia da Estrela da Morte. Os filmes são um evento que permitimos perder.
Kathleen Kennedy ainda endossa: “Estávamos no meio da produção de Indiana Jones e George, como roteirista e produtor, ficou inquieto em ver Spielberg dirigir. A inquietude era de Lucas e de metade da mão de obra que no seu interior queria voltar a trabalhar em Star Wars”.
Já na mesa dos diretores, Filoni parece ser clínico contra o pessoal do “a Disney estragou o meu Star Wars”. Filoni narra com paixão como foi aprender por convivência o universo da mente criadora de Lucas e, assim como quem entra numa banda, entrar em harmonia com ela ao tocar uma música:
Nunca senti que Star Wars fosse algo meu. Star Wars faz parte da vida das pessoas, algo que elas veem regularmente e quando dizem que George Lucas é o criador. Acho que as pessoas não valorizam o que isso significa. Eu valorizo, mas trabalho com ele. Eu o vi no processo de criação, vi a pessoa que cria as falas e diálogos e entende o que é Skywalker num nível quase fundido a ele. Eu entendi isso e nunca senti que Star Wars fosse algo meu. Me sentia privilegiado por poder contar a história e grato por ter feito isso com George. Tentar escrever e contar histórias e ele dizer: ‘Eu não quis dizer isso, não é assim que funciona’. E ele corrigia com razão. A história é dele. Ele criou o universo com a Milleniun Falcon, o Chewie, Yoda e até Darth Vader saiu da cabeça dele.
Você só precisa usar isso pra se manter fiel e fazer o que ele fez achando novas maneiras de contar essas histórias
Gostar de cinema nos permite acompanhar o depoimento de Rick Famuyima, um dos diretores da série. E ver que, embora os filmes dele não se pareciam com Star Wars, ele testemunhou com muito louvor sua paixão pela saga e quais cuidados manteve ao dirigir seus dois episódios dentro da temporada. Ou ver Pedro Pascal traçando um paralelo de que as fantasias refletem temas universais como inclusão diversidades e conflitos que cabem numa galáxia tão grande como essa.
Na mesa dos produtores, Favreau quis saber dos produtores como foi se envolver com George Lucas e compreender que essa mente inquieta e criativa possa ter contaminado estes profissionais. O trabalho em Hollywood muitas vezes é burocrático e torna o processo de produção algo muito próximo de uma linha de montagem automobilística. Quando estes profissionais citam Star Wars, é como se o desdobramento de se envolver com a produção viabilizasse que estes profissionais parassem de trabalhar e estivessem envolvidos com algum tipo de hobby. É aí que notamos os profissionais se abrindo igual a uma mala velha. Foi Knoll citando o uso de action figures para produzir primeiro episódio, Hal Hickel falando da evolução dos efeitos visuais antes de Jurassic Park, mas em Exterminador do Futuro 2 e até O Segredo do Abismo.
Ao que parece, os diretores mais famosos por experimentar estéticas artificiais no cinema acabam sendo os que mais puderam extrair o máximo de si em seus filmes: James Cameron, George Lucas, Robert Zemeckis. E essa geração nova de diretores, que pensa na prática digital e nos narram como foi ficar maravilhado ao assistirem Star Wars pela primeira vez no cinema. Todos testemunhos falam mais do mundinho de cada um ao redor do filme.
Cabe aqui um testemunho do editor que ao ir com amigos assistir Episódio I no cinema, lhe marcou muito por ser a primeira semana com habilitação e, na saída do filme, enfrentar uma neblina no caminho de volta que lhe fez lembrar da trilha do campo de asteróides.
Carl Wheaters, o eterno Apollo Creed (em Mandalorian interpreta Greef Carga), é o mais espirituoso dos atores e demonstra particularidade ao discorrer acerca de Joseph Campbell, o filósofo que Lucas se debruçou para enxertar tanta mitologia e arquétipos nos filmes: “Ele era, à sua maneira, como uma fenda para outro universo ainda desconhecido para mim. Era um fenômeno que ia além do que representava para mim, mas no que se transformou”.
O documentário, mais curto que o primeiro, se encerra de volta na mesa dos diretores onde Taika Waititi destaca sua sequência mais marcante em O Império Contra-Ataca, quando Luke tenta tirar sua X-Wing do pântano, no qual diz: “Não acredito”, o que causou em Yoda a resposta do porquê de seu fracasso. O depoimento causa arrepios à diretora Bryce Dallas Howard. Estão ali não diretores que nos fazem sonhar, mas de volta à infância de cada um, momento que nos coloca muito próximo à eles.
Deborah Chow, começa citando a dificuldade de encontrar o tom certo da domesticação de IG-8 pelo Kuill. O capítulo três ficou claro que era faroeste com Yojimbo: o Guarda Costas de Akira Kurosawa, com muita poética e lirismo na atmosfera, como um anão vestido de ugnaught vai ensinar um animatronic a andar? Imediatamente Favreau rasga elogios da maneira que ela roda o prólogo do episódio sobre trazer a humanidade a dois personagens não humanos.
O ato final deste documentário é justamente quando Favreau e Wheaters comentam a paternidade do Mando em relação à criança. Neste momento, Filoni conta o sentido da letra Duel of the Fates e o que significa as figuras paternas anuladas por inconveniência das escolhas e o destino que a jornada do herói nos leva. É aí que entendemos isso desde as prequels até a trilogia original. Se você, caro leitor, tiver acesso a este documentário, assista-o de maneira séria e leve as palavras dos realizadores empolgados para o resto da vida. É muito mais que um making of. É um tratado sobre herança entre gerações, seja ela entre realizadores ou entre meros expectadores que no final, fazem parte da mesma festa ou ritual.
Prof.º Ms Vebis Jr
Mestre em Cinema
Especialista em Comunicação
Graduado em Audiovisual e Multimídia