Por que Star Wars: A Ascensão do Skywalker não pode sabotar Star Wars: Os Últimos Jedi?
Era manhã de sábado quando entro no grupo de Whatsapp da União Star Wars e leio o Marcelo, membro do Jedicenter, colando esta matéria no grupo com um único pedido: “LEIÃO [sic]” na piadinha gráfica pra incentivar a todos os sites que ali estão presentes em encarar um texto. Bati o olho no link e pensei: “Caraio [sic], é da Forbes, me deixa ver quem assina” – e logo notei que era Scott Mendelson, que eu já sigo pelo Twitter. Ótimo, passei meu café com pouco açúcar e sentei pra ler o texto que sempre me agrada na forma que o crítico escreve.
O texto é assinado como um relatório circunstancial: “Hoje é 19 de julho de 2019, o que significa que resta exatamente cinco meses para as prévias de quinta-feira da estreia nacional de Star Wars: A Ascenção Skywalker. Enquanto nos preocupamos com o que o fim de semana de abertura de O Rei Leão representará para a Disney e para o cinema como um todo, você deve se lembrar de que eu também era um pouco rabugento com Star Wars: O Despertar da Força, Avatar e Titanic na América do Norte. Isso foi em parte porque também era um exemplo da Disney aproveitando a pura nostalgia da marca e capitalizando as realizações artísticas daqueles que vieram antes”.
“Fale o que quiser sobre Vingadores: Ultimato, por ter ultrapassado Avatar nas bilheterias globais, mas esse épico do Universo da Marvel foi pelo menos um triunfo momentâneo graças ao fandom no presente e uma década de decisões inteligentes, resultando em blockbusters bem feitos e geralmente bem recebidos, que põem personagem sobre enredo e mitologia. A ironia é que, dois anos depois, Os Últimos Jedi, de Rian Johnson, ofereceu uma história de Star Wars que enfatizava a trama do personagem, e muitas pessoas não pareciam se importar com isso. É claro que ainda estamos falando de um filme bem avaliado e (assim como disse o Cinemascore) que atraiu US$ 620 milhões para o mercado interno e US$ 1,33 bilhão para todo o mundo, mas eu discordo”.
“A atenção está agora em A Ascensão Skywalker. As duas perguntas são como ele se comporta após a treta online relacionada ao Episódio VIII e Solo: Uma História Star Wars (que provou que nem mesmo colocar as palavras “Star Wars” no título poderia causar um impacto de um filme que ninguém queria ver) e se o fervor online sobre Os Últimos Jedi causou mudanças artísticas no terceiro filme. Estou inclinado a dar J.J. Abrams e Kathleen Kennedy o benefício da dúvida, mesmo porque todas as partes estão esperançosas o suficiente para saber a diferença entre a raiva online e a reação do mundo real”.
“Eu posso fazer algumas contas e especulações sobre as bilheterias, nos EUA e no mundo afora, do filme em outro dia. Será que ela aumentará 20% da sequência, assim como Retorno de Jedi e Vingança dos Sith ou será como Jurassic Park III e será comparativamente ignorada no exterior por plateias que nunca obcecaram Star Wars na medida em que fizemos? Mas por enquanto, eu queria ter um momento para discutir algo que deveria ser óbvio em relação à maior revelação de Os Últimos Jedi. Sim, eu estou falando sobre a noção de que os pais de Rey não são famosos ou importantes, mas sim de ninguém, que a vendeu como escrava antes de morrer pela morte de um pobre miserável”.
“Para registro, não foi a Disney, nem mesmo J. J. Abrams que convenceu a internet em geral de que Rey (Daisy Ridley) possuía uma herança grandiosamente importante. Essa era a internet sendo a internet, passando dois anos obcecada por supostas pistas e teorias de fãs que argumentavam que ela era filha ou de Luke Skywalker ou Ben Kenobi ou a piada que chegou a relacionar ela com o Jar Jar Binks”. Isso deve ter ocorrido lá nos Estados Unidos, aqui eu não lembro de ter lido nada a respeito. “A internet transformou o que costumava ser um bate papo no playground ou na mesa de almoço em conteúdo online monetizável. Teorias dos fãs são erguidas como se fossem estudos artísticos, e os filmes são então criticados por não os alinhar”.
Vale dizer que boa parte das especulações que nós lemos aqui no Brasil eram mentalidades de gente que lia o Universo Expandido ou teorias loucas que forçavam o caminho usual sem ousadias de tentar apontar a saga para um além da família Skywalker, que é o que até então temos com Rey, já que Kylo é o sangue real da família problemática em questão.
Scott Mendelson ainda continua ironizando num contexto “marvelete [sic]”: “Desculpa pessoal, Steve Rogers e Bucky Barnes nunca iriam se tornar um casal, e se Elsa conseguisse uma namorada em Frozen II, será que isso aconteceria porque os cineastas fizeram uma escolha artística, ou porque optaram para não seguir a tendência que a internet escolheu? E se você realmente prestou atenção nos filmes de Star Wars, tanto a trilogia original quanto as maneiras pelas quais Os Último Jedi e (em menor grau) O Despertar da Força consertaram a mitologia, você saberia que o rabugento Luke Skywalker de Os Últimos Jedi foi a única escolha lógica e que transformar os pais de Rey em ninguém fez mais sentido para o arco de seu personagem”.
“A razão pela qual o “Darth Vader é o pai de Luke Skywalker (Mark Hamill)” é tão chocante em O Império Contra-Ataca, além do simples fato de que esse tipo de narrativa funciona profundamente para algo que realmente causou uma surpresa geral que se transformou num evento cultural e que se seguiu por décadas, foi isso que afetou a visão de mundo de Luke. Luke cresceu sem saber muito sobre seu pai, e Ben Kenobi (Alec Guinness) disse a ele que seu pai era um herói de guerra que foi morto em ação por um dos principais tenentes do Império. A revelação lança o mundo de Luke em fluxo, tanto em termos do que ele sabia ser verdade e cujo exemplo ele pretendia viver”.
“Por outro lado, Rey passou décadas esperando em um planeta de lixo na esperança de que sua família voltasse para ela com apenas um lampejo da memória da nave que parte. Ela espera pela família que perdeu, com a presunção implícita de que encontrar sua família finalmente colocará em ação a pessoa que ela deveria ser e o caminho que ela deveria seguir. Então, quando Rey percebe, e Kylo Ren (Adam Driver) confirma, que seus pais não eram ninguém, que não a amava e a jogou fora, ela é confrontada com a ideia de que ela não é especial e ela tem que fazer seu próprio caminho sem qualquer orientação ancestral. Rey está verdadeiramente sozinha no universo”.
Aqui nesta parte, Scott nos joga a premissa que o respaldo familiar que era tão importante nos filmes da década de 1970 para 1980, parece não fazer o mesmo sentido nos dias de hoje. Tanto que os personagens que eram arquétipos simples de se analisar nas outras duas trilogias, nesta terceira temos mais personagens complexos, como é o caso de Kylo que tem mais camadas da formação de sua personalidade. Basta analisar que Star Wars se atualizou com a sociedade atual, tendo inclusive, a realidade de famílias devastadas por separação ou tragédias que criavam órfãos problemáticos.
“Em ambos os casos, a revelação de parentesco é a pior notícia possível que ambos os personagens, respectivamente, poderiam ter recebido. Não apenas o pai de Luke está vivo, mas ele é um dos maiores vilões da galáxia e realmente quer que seu filho se junte ao exército do mau também. Não só a mãe e o pai de Rey não estão mais vivos, eles eram absolutamente ninguém, que a vendeu por dinheiro de bebida e atualmente estão enterrados em uma cova rasa. Como principais pontos de virada para o final do “segundo ato” dessas trilogias de Star Wars, elas funcionam porque fazem buracos nas noções comparativamente simplistas ou fantásticas de como esses heróis se definem”.
“Para o registro, eu não acho que A Ascensão Skywalker, que está quase pronto, vai puxar um “Ei, Kylo mentiu, Luke Skywalker foi seu pai, mas ele simplesmente não sabia!” Fazer isso não seria apenas ceder aos trolls on-line e permitir que a desaprovação das minorias substituísse a aprovação da maioria, mas negaria as tentativas da nova trilogia de recriar a mitologia de Star Wars como um conto folclórico de “qualquer um pode ser o especial”. Perderia totalmente o que fez o Vader revelar um grande negócio. Estaria trocando de “herói recebe más notícias que muda sua mente” para “herói recebe uma boa notícia que oferece a tranquilidade de que necessita”.
“Enquanto isso, lembre-se de que a maioria das teorias dos fãs são inofensivas, desde que não contagie suas presunções sobre o produto acabado e faça com que você tenha um filme (ou programa de TV) responsável por não corresponder a essas teorias. É interessante que o personagem de Li Shang se tornou um ícone bissexual baseado na teoria dos fãs, mas isso não significa que o futuro remake de Mulan da Disney seja homofóbico por não incluir o personagem. E só porque você assistiu O Despertar da Força e presumiu que o Supremo Líder Snoke (Andy Serkis) tinha uma rica história de fundo, uma identidade secreta ou um papel enorme a desempenhar não faz Os Últimos Jedi prestar contas por não cumprir sua especulação antes do lançamento. E convenhamos, Snoke era apenas uma projeção no sétimo filme. Fomos ter noção do seu poder nas mãos do diretor que justamente deu cabo de sua existência”.
“Esse lado pessoal da Rey em não ser ninguém era uma inversão válida de tropos conhecidos de Star Wars, um que provavelmente foi menos chocante para aqueles que assistem Star Wars: The Clone Wars ou Star Wars: Rebels e entende como funcionam essas engrenagens que o “storygroup” permite que aconteça. Ele também se aliou às expectativas e / ou arcos específicos do personagem específico da heroína. Rey não é Luke Skywalker, como descobrimos abruptamente em Os Últimos Jedi. A noção de pessoas que clamam por seus pais serem importantes mostra nada menos que uma geração de fãs de Star Wars determinada a dar a ela uma história idêntica, mesmo à custa de seu arco específico. Eu espero que A Ascensão Skywalker já saiba que Rey não precisa ser especial para ser especial”.
Essa pluralidade de ideias e expectativas ou até mesmo teorias deveriam criar nas pessoas uma espécie de preparo para o que der e vier, pois quase todas hipóteses são válidas a essa altura do campeonato. Por isso que aqui neste site você poderá encontrar textos de vários tipos de pessoas: os “ReySky”, os “Reylos” (aqui mais por desconfiança mesmo) e pessoas como eu, que de tão cética, não cria expectativa porque sabe que essa senhora (a dona expectativa) é a mãe da Frustração.
Só queremos que esta trilogia sequel acabe de maneira memorável.
Prof.º Me. Vebis Jr
Mestre em Cinema
Especialista em Comunicação
Graduado em Audiovisual e Multimídia