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Oscar e Star Wars, uma reprise dos anos 70

Como segue a tradição, logo após a cerimônia do Globo de Ouro, é costume saírem outras premiações/parâmetros como Bafta, Spirit e a premiação dos críticos de cinema. Em meio a esta série, chegou a esperada hora dos Nominees, os indicados ao Oscar, prêmio da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Los Angeles, na Califórnia.

Nós, chamamos a premiação simplesmente de Oscar, nome dado a estatueta feita de estanho com um banho de ouro de 14 quilates e pesa aproximadamente 4 quilos, porém, o significado representa o mérito da academia. Ha várias lendas do porquê deste nome, mas a mais interessante é a de que a atriz Bette Davis teria apelidado a estatueta com o nome do seu primeiro marido, devido à semelhança. Na verdade, quem deve saber quem é o careca de braços cruzados com uma espada em cima do rolo de cinema, é Cedric Gibbons, lendário diretor de arte da Metro Goldwyn-Mayer, que criou a estátua. Sim, aquela produtora do Leão rugindo mesmo, você não está ficando gagá.

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Foto: Oscars

Óbvio que em épocas de fãs raivosos de Star Wars soltos por aí cometendo atrocidades, terão aqueles que desmerecem à premiação descreditando a importância da cerimônia, como acusando o evento de ‘lobista’ e ‘mercadológico’, mas também sabemos que na noite do evento, quase todos estão ali de olhos nos atores, diretores e produtores que serão agraciados com a estatueta.

No mercado de cinema, uma nomeação e premiação já são elementos suficientes para elevação do piso salarial de um ator, ou torná-lo atrativo para novas obras de produções grandes. Dia 14, o diretor Ang Lee (Brokeback Mountain) e Guilhermo Del Toro (Hellboy, Labirinto do Fauno) anunciaram os indicados ao Oscar 2016 que correspondem à todos filmes que tiveram vida mercadológica do começo do ano de 2015, até o seu final em agendas de estreias norte americanas.

Hoje, com muito mais categorias que antigamente, nosso ideal é medir pensando em Star Wars. Em 1977 existiam 22 categorias na premiação e, atualmente, estamos com 24.

Oscar e Star Wars

Muita gente se questiona por que os filmes nunca concorreram as categorias principais. A explicação é de que quando George Lucas quis construir seu império dos sonhos, o cinema estava mergulhado em pessimismo. Os americanos estavam ainda com um gosto amargo do pós Vietnam e muitas outras obras derrotistas atrapalhavam a capacidade do americano voltar a sonhar.

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George e Marcia Lucas – Foto: Oscars

Em meio aquele tom sério, será que tinha alguém querendo financiamento pra fazer filme?

SIM, TINHA!

George Lucas não é santo. Trabalhou com Francis Ford Coppola na American Zoetrope e quase jogou a empresa ladeira abaixo fazendo o THX-1138. Na época, ninguém queria fazer sua próxima obra, uma fábula espacial de um fazendeiro em meio a um universo futurista com naves e mais envelhecido, porque parecia um velho oeste com pessoas utilizando roupa de cinema japonês.

– Já que ninguém quer investir no meu filme, faço eu o investimento e financiamento do filme que acredito.

Isso, amigos, é ser um cineasta independente. É não se atrelar a empresas de financiadores de cinemas e filmes e, assim, ficar de rabo preso. Pra quem não entende o poder de um produtor executivo, basta ver os extras do DVD de Hellboy quando o Guilhermo Del Toro revela a dificuldade de se fazer um filme de um herói que parece diabo. Era ser firme em negar o produtor dizendo: – Ele não pode ficar vermelho quando fica nervoso?

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Foto: Oscars

É, caros amigos, ser diretor independente e ser produtor é criar um mundo do jeito que quer sem ninguém meter o bedelho. Um sonho, do jeito que qualquer sonhador desejaria, mas tem um porém nisso tudo…

O Porém

Você perde a chance de ter seu filme concorrendo à prêmios na Academia. Óbvio que não condena o filme todo.

Cinema é uma obra do coletivo para o coletivo e ele tem uma série de departamentos, onde inúmeros trabalhadores destes departamentos são sindicalizados e isso ajuda para que um diretor independente perca esse “direito de participar da festinha” nas categorias que o circundam. Mas os peões que dão o duro pro filme ser realizado podem comemorar. As categorias técnicas deste filme (daquele barbudo folgado numa camisa xadrez que não entrou no esquema), são categorias que sempre concorreram, mesmo que pra passar vergonha de perder pra alguma obra estranha que fatura estatueta na sua frente. Pelo menos, foi o que senti quando vi “Star Wars – A Vingança dos Sith” perder para “”Crônicas de Nárnia” na categoria maquiagem.

Um exemplo recente? Robert Rodriguez fez a adaptação de “Sin City” de Frank Miller. Ele e Quentin Tarantino se divertem fazendo filmes. Rodriguez, arrisco pensar que se diverte mais ainda, pois experimenta mais (os Spy Kids, Shark Boy e Lava Girl, Planeta Terror, Machete) e isso fez dessa liberdade de criação, não submeter aos produtores executivos. Robert Rodriguez manda e desmanda com sua empresa Troublemaker (sugestivo, não?) e chegou ao ponto de por o nome de Frank Miller na direção de Sin City.

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Frank Miller e Robert Rodriguez

A academia não gostou, pois Miller não é sindicalizado e nem é a ‘praia’ dele se enveredar pro cinema (vamos fingir que esquecemos o roteiro de Robocop 2) e pediram que tirassem o nome dele da direção. Resultado: No Scream Awards onde Sin City ganhou prêmios, Rodriguez pegou a estatueta em formato de crava de matar vampiros e berrou midiaticamente “FUCK YOU HOLLYWOOD” e manteve o nome do mito de HQ’s no posto de diretor.

Voltando a Star Wars

Nem tudo foram tristezas. A surpresa e revolução que Star Wars (1977) causou antes mesmo de ser chamado de “Uma Nova Esperança” gerou nominações que nunca mais teria novamente: Todos técnicos, o que torna previsível, e concorreu até pra roteiro e filme.

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Foto: Oscars

O site imdb tem imagens da premiação e sugiro assistir a categoria figurino, onde mostra vídeo de personagens de todos os concorrentes desfilando o figurino, chegando ao ponto dos personagens de Star Wars tirar aplausos do público.

‘Império Contra Ataca’ e ‘O Retorno de Jedi’ tiveram 4 e 1 prêmio, respectivamente.

Na época dos episódios Prequels, tivemos apenas nominações sem premiações, o que já é um ganho ter sido mencionado, pois esta indicação gerou a coragem da era dos filmes Chroma Key chegarem sintomaticamente às concorrências de outros festivais americanos – como foi o caso de Capitão Sky, 300, Sin City entre outros.

Aqui e agora

Aqui estamos em 2016, frente a uma lista que nos remete diretamente ao que a trilogia clássica fez: notoriedade do cinema de fantasia mediante aos recordes de bilheteria que o filme causou e ainda causa.

Aquela reclamação de que o cinema é puro lobby traz umas vantagens em indicações. Porém, Star Wars cai na boca do gargalo olhando para um filme muito parecido com sua história lá em 1977 (concorrendo em 1978) a pérola chamada Mad Max.

Mad Max é uma jóia que só chegou onde está porque os números de bilheteria confirmam que um filme destes tem cacife pra estar onde chegou: Um filme competente, batalhador e que o povo o fez chegar ao topo de forma modesta.

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Foto: Oscars

Se o mundo fosse justo, este filme concorreria a mais categorias e não traria uma surpresa infame vista na cerimônia do Globo de Ouro e que deixou a obra de George Miller de mãos abanando. Ainda acho triste ver que onde Star Wars possa ir bem, lá está Mad Max para ganhar seu premio de consolação na frente, como uma solteira que aguarda a noiva lançar o buquê de flores.

O filme de JJ Abrams concorre estranhamente na categoria montagem. As montadoras Maryann Brandon e Mary Jo Markey seguraram o rojão, mas mudaram completamente a pegada e ritmos que a era da equipe de Paul Hirsch, George Lucas e sua esposa (trilogia clássica) e Ben Burtt (Trilogia de Anakin) tinham na condução narrativa.

John Williams concorre a trilha sonora score. Ah! Sim, Score é o nome que chamamos as trilhas incidentais que ajudam na narrativa do filme e tornam as aventuras mais instigantes.

Vocês sabem que Meryl Streep é uma atriz que se não concorre, tem cadeira cativa pra ela em todos cerimônias atuais. É isso o que ocorre de piada com John Williams que chega a sua 50 indicação, talvez foi quem mais concorreu ao Oscar na minha tenra memória.

Porém, a trilha tem que dizer muito dentro do filme, quase que um elemento primordial pra uma cena se tornar memorável. Star Wars: O Despertar da Força padece de uma trilha que acentua em menor peso os momentos do filme, algo intrínseco na montagem dos outros filmes (o que não diminui o valor do filme para o pessoal do Sociedade Jedi, apenas uma mudança da direção observada). O peso desta trilha sonora, se torna mais impactante ao escutá-la fora do filme, pelo menos aos que ouviram a trilha comprada, no Spotify e até outros métodos.

O Oito Odiados de Quentin Tarantino tem trilha do outro gênio, maestro Ennio Morricone, que nos primeiros momentos do filme, nos assusta com uma diligência em meio a uma nevasca, deixando na dúvida o gênero do filme. Talvez o trunfo que faça a estatueta de “conhecimento à contribuição na franquia Star Wars” escorrer pelo ralo.

Aqui, qualquer um dos gênios mereceriam ser premiados. Seja Williams que já tem 5 estatuetas ou Morricone que tem apenas uma estatueta de prêmio pela sua contribuição, o Oscar honorário.

Na categoria de efeitos especiais, Star Wars deveria ser o favorito, porém, quando surgiu Mad Max trazendo a fama de um filme todo feito sem Chroma Key, com efeitos práticos (não longe do que Star Wars fez) é provável que o filme de Miller faça a dobradinha de efeitos visuais e direção de fotografia, já que um departamento dependeu e complementou ao outro. Não vejo possibilidade da estatueta de visual FX ficar longe destes dois filmes que trouxeram o frescor dos efeitos visuais artesanais.

Agora sim, os prêmios que Star Wars mais tem a chance de ganhar: Mixagem de Som e Edição de Som. Duas categorias que o público comum não compreende na maioria das vezes.

Todos sabem que cinema é uma obra das evidências enganosas. Para que nos engane em acreditar naquele mundo que se passa na tela, os filmes precisam se completar de signos e significados para que inconscientemente, participemos daquele mundo.

Edição de som é um dos trabalhos mais difíceis de concluir, já que hoje em dia, tudo que rodeia os diálogos são sons criados. Criar sons, tem o nome do seu inventor, Foley e um filme como Star Wars necessita de Foley em 95% das cenas. Ben Burtt foi editor de som na trilogia de Vader e montador na trilogia de Anakin e em seus extras de som, mostra como era a elaboração das criações. Neste novo filme, há uma equipe de 51 pessoas envolvidas na edição de som e na mixagem (Burtt novamente como design de som) que significa condensar, equalizar e distribuir as pistas de audio: os diálogos, os sons, os ruídos, a trilha sonora de forma que não seja percebida.

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Foto: Oscars

Esta é a grande chance do filme ganhar estatuetas.

Mas lembremos que Star Wars é uma das poucas obras que não precisaram de Oscar para atingir um patamar de notoriedade pra atingir as pessoas ou fazer seus profissionais ganharem renome.

A academia ainda tem muitos membros votantes (hoje em dia quase 6 mil membros) que torcem o nariz para comédias e filmes fantasiosos, salvo a exceção do paradigma quebrado com Senhor dos Anéis que ganhou o topo das estatuetas com seu terceiro filme, O Retorno do Rei. Já os dois primeiros: A Sociedade do Anel e As Duas Torres faturaram também apenas os prêmios técnicos.

Nosso papel aqui é torcer que o filme em mãos da Disney, alavanque novas categorias nunca antes concorridas pelo simples fato de não estar mais nas mãos do maior cineasta independente americano.

Não é difícil. Não precisa do Oscar como dito, mas se vier, melhor ainda aos fãs.


Vebis Jr é produtor, diretor e mestre em cinema.

Lecionou em escolas como Academia Internacional de Cinema, Etec Roberto Marinho e Unimonte

Vebis Jr

Professor/produtor/pesquisador/podcaster em Cinema. Velho anarco punk rocker! https://twitter.com/Vebisjunior